domingo, 25 de março de 2012
‘Smash’ estreia no canal Universal!
Em agosto deste ano Marilyn Monroe completa 50 anos de sua morte. Representante de um período de ouro da meca do cinema, a atriz é lembrada como o símbolo sexual de Hollywood. Ela iniciou sua vida como Norma Jeane e a encerrou como Marilyn. Ao longo de seus 36 anos de vida, sofreu de depressão, solidão e um grande temor de ficar louca como sua mãe. Como uma espécie de Jeckyll e Hyde, Norma criou Marilyn, que com o tempo tomou seu lugar. Foi Marilyn que o público conheceu e é ela que é cultuada. Essa dualidade é retratada na série através das duas personagens que disputam a oportunidade de interpretá-la.
Criada por Theresa Rebeck (Law & Order: CI), com base em uma ideia de Steven Spielberg, a série foi originalmente oferecida para o canal a cabo Showtime. Mas quando Bob Greenblatt, diretor de programação do canal, passou a exercer esta função na NBC, ele levou Smash com ele.
Apresentando músicas originais, além de alguns canções já conhecidas, a história acompanha a vida de personagens que atuam nos bastidores de produção de um musical da Broadway, o qual pretende narrar a vida de Marilyn Monroe. Já renovada para sua segunda temporada, Smash estreia no canal Universal no dia 28 de março, às 23 horas.
O texto abaixo contém spoilers.
A ideia surge quando Ellis (Jaime Cepero), assistente de Tom (Christian Borle), sugere que um musical sobre Marilyn Monroe poderia atrair o interesse do grande público. Assim, Tom, compositor, e sua parceira e amiga Julia (Debra Messing), letrista, começam a brincar com a ideia de criar algumas músicas para ver no que dá. Pouco depois os dois já estão envolvidos com os primeiros preparativos para a montagem do musical.
O trabalho interfere com a vida pessoal de Julia, que tinha prometido ao marido Frank (Brian d’Arcy James), um professor, que se afastaria da carreira por algum tempo para poder se dedicar ao processo de adoção de uma menina chinesa.
Por outro lado, para Eileen (Angelica Huston), o musical pode representar sua independência. Durante anos ela e seu marido formaram uma bem sucedida parceria como produtores de musicais na Broadway. Agora, passando por um processo de divórcio litigioso, Eileen precisa provar ser capaz de produzir sem a ajuda do marido. Para tanto, ela garante a presença de Derek Wills (Jack Davenport), um respeitado diretor e coreógrafo, que estava envolvido com a remontagem de My Fair Lady, projeto inacabado de Eileen e de seu ex-marido. A escolha do diretor desagrada Tom, gay assumido, que não gosta de Derek, um conquistador homofóbico.
A partir do momento em que o musical começa a ser de fato desenvolvido, a história passa a se concentrar na disputa à la American Idol entre a apática Karen (Katharine McPhee) e a determinada Ivy (Megan Hilty) pelo papel de Marilyn. A escolha é feita ao final do segundo episódio, mas ela não é definitiva. Como o próprio Derek diz, leva-se cinco anos (tempo necessário para a série ter 100 episódios) para que um musical seja produzido e estreie. Ao longo desse período, muita coisa pode acontecer.
Com sete dos quinze episódios produzidos para a primeira temporada já exibidos, a série passou de uma história sobre os bastidores de produção de um musical para um melodrama em torno dos desejos e vontades dos personagens centrais e seus interesses pessoais, que se sobrepõem ao trabalho. A montagem em si ficou em segundo plano.
Até o momento a trama destaca as situações vividas por Julia, Karen e Ivy. A primeira passa rapidamente de uma esposa com um casamento estável, embora com problemas, para o papel de amante que se envolve com um colega de trabalho. Este é um ex-namorado que reaparece em sua vida. Protagonizando uma das situações mal desenvolvidas da série, Michael (Will Chase) ignora sua esposa e um filho pequeno para tentar reconquistar Julia. Na vida real, Will foi responsável pelo fim do casamento de Debra que, após onze anos de união, pediu o divórcio de Daniel Zelman, com quem tem um filho, para assumir seu relacionamento com Will.
O destaque dado a Karen e Ivy já era esperado, visto que elas disputam o papel principal. Karen é uma jovem que veio de uma família tradicional de Iowa. Sonhando em se tornar uma estrela da Broadway, ela se muda para Nova Iorque. Sem querer o apoio financeiro da família, que espera vê-la recobrar o juízo, Karen trabalha como garçonete enquanto faz testes para diversos musicais. Nesse meio tempo ela canta em bares de karaokê, festas e outros eventos.
O problema é que Karen nunca lutou de fato por seus sonhos. Sem se dedicar aos estudos que possam aprimorar o dom que tem, apoiando-se no que sua voz é capaz de oferecer, ela não estabeleceu um bom currículo ou um círculo de amizades no meio. Sendo rejeitada ou realizando trabalhos inexpressivos, Karen consegue chamar a atenção de Derek, que insiste em lhe dar uma chance.
Karen vive com Dev (Raza Jaffrey), que trabalha no gabinete do prefeito. Embora não façam parte do mesmo universo, os dois parecem ter encontrado um ponto de equilíbrio em sua relação. Mas é ele quem dá mais apoio ao trabalho de Karen que ela ao dele. Algo que, ao longo da série, deverá pesar.
Ivy é o oposto de Karen. Filha de Leigh Conroy (Bernadette Peters), uma lenda da Broadway que a desencoraja a seguir seus passos (à la Judy Garland-Liza Minnelli), Ivy vem lutando há dez anos para construir sua própria carreira. Começando por baixo, Ivy atua como backing vocal em diversos musicais. Estudando e se aprimorando, ela estabeleceu uma rede social e de contatos para conseguir crescer no meio. Por isso mesmo, ela acha injusto que uma jovem sem qualquer garra ou noção de como funciona o ambiente no qual pretende trabalhar, apareça para lhe tirar a grande chance de conseguir finalmente estrelar um musical. Ivy é amiga de Tom, que desde o início defende sua contratação. Considerando-a a escolha perfeita para interpretar Marilyn, ele mede forças com Derek, seu inimigo declarado.
Nos últimos episódios exibidos nos EUA, a série começou a dar um pouco mais de atenção ao personagem de Angelica Huston, que luta para conseguir financiamento para a produção do musical. Com anos de experiência, tendo testemunhado dezenas de sucessos e fracassos e conhecendo todo mundo que atua no mercado, ela ainda precisa mostrar ao telespectador que aprendeu alguma coisa sobre o funcionamento da indústria da Broadway.
A introdução das cenas musicais em Smash segue o estilo explorado por Fama, série da década de 1980 que adaptou o filme de mesmo nome. Nesta, a história era ambientada em uma escola onde os alunos tinham aulas de música, dança, canto e arte dramática, entre outras. Assim, em Smash, os números musicais surgem durante os testes e os ensaios, bem como nos bares de karaokês e em festas. Mas em episódios recentes, os musicais também começaram a ser inseridos em meio a diálogos ou cenas de personagens vivendo um momento mais intimista, o que pode, a longo prazo, comprometer a série. Com exceção dos testes e dos ensaios, as demais músicas nada têm a ver com a história do musical que está sendo montado.
Mas o que mais chama a atenção, ao menos da minha, é a forma como os roteiristas inserem ao longo dos episódios referências à vida de Marilyn. Elas não seguem um critério, são apenas elementos que podem ser comparados ou identificados como tal. Temos, por exemplo, Karen e Ivy, que disputam o mesmo papel.
Karen poderia ser considerada a própria Norma Jeane, mulher ingênua, sem qualquer experiência artística, que sonha com a oportunidade de se tornar uma estrela, mesmo tendo pouco preparo para isso. Muito embora sua aparência se encaixe mais na descrição da ‘outra mulher’ na vida de Marilyn. Karen é morena, muito magra, com um comportamento recatado e tímido. Vindo de uma família tradicional da classe média alta, ela ainda está presa às convenções sociais. Assim, Karen tenta definir seu trabalho a partir de suas próprias regras de conduta. Com essas características, ela também poderia ser Jackie, esposa do presidente John Kennedy (que teve um caso com Marilyn Monroe), embora tenha sido Karen quem interpretou a música Happy Birthday Mr. President para o diretor Derek Wills, homem cuja atenção é disputada.
Já Ivy é o oposto. Ela representa a mulher determinada, que sabe utilizar sua aparência e sensualidade para conquistar seus objetivos. Ao mesmo tempo, ela revela ser uma pessoa insegura e neurótica quando se vê ameaçada de perder a oportunidade pela qual tanto lutou. Sua insegurança aliada à pressão de ser a profissional que todos esperam que ela seja leva Ivy a cometer erros, o que provoca atrasos nos ensaios. Em um determinado episódio, sua situação prejudica sua voz e provoca a suspensão dos ensaios. Tentando se recuperar rapidamente, ela apela para o uso de remédios, mesmo sabendo que eles podem lhe causar efeitos colaterais. Com essas características, Ivy seria a própria Marilyn.
O elo de ligação entre Karen e Ivy é o diretor Derek Wills, que aqui representa Kennedy, um homem considerado brilhante, que está acima de todos, com o poder de decidir o futuro de cada um, bem como a direção artística que o musical terá, embora ainda precise seguir as orientações e opiniões do ‘poder executivo’, que neste caso é representado pela produtora (Eileen) e pelos compositores (Tom e Julia). Embora já tenha sido divulgado que em um próximo episódio, Derek pedirá o apoio de Karen para tentar conseguir conquistar maior controle artístico do musical.
Derek usa seu poder para manipular as duas candidatas, mantendo-as de alguma forma dependentes da vontade dele. Enquanto Ivy cede à pressão e vai para a cama com Derek sempre que este sente desejo por ela, Karen se recusa a ceder, estipulando limites. Mas a presença das duas em sua vida não o impedirá de considerar outras alternativas. Já foi divulgado que Uma Thurman terá participação nos últimos cinco episódios da primeira temporada de Smash, interpretando Rebecca Duvall, uma atriz famosa que deseja o papel de Marilyn. Para os produtores, ter seu nome aliado ao projeto significará atrair o interesse de investidores.
Entre outros elementos que poderiam ser comparados à vida de Marilyn está o fato de que Tom escreveu o musical já pensando em Ivy no papel principal, da mesma forma que Arthur Miller adaptou uma história sua para ser transformada no filme Os Desajustados, com Marilyn em mente para o personagem da divorciada Roslyn.
Ellis, o assistente de Tom, é uma espécie de Eve, personagem de Anne Baxter do filme A Malvada, um dos primeiros que deu a Marilyn um certo destaque. Ambiciosa e dissimulada, Eve era a assistente de Margo (Bette Davis), uma grande estrela do teatro. A relação de Ellis e Julia em Smash se assemelha a de Eve e Birdie, empregada de Margo.
Apesar dessas referências indiretas, a série insiste em acrescentar diálogos que explicam ao público quem é Marilyn, o que ela pensava, o que desejava, como ela agia ou como se sentia, algo que serve apenas para enfraquecer o texto.
A proposta de Smash é muito boa, as situações são claramente definidas e os personagens conseguem se estabelecer rapidamente, embora tenham dificuldades de escapar da caricatura (culpa dos diálogos apelativos). Mas ela peca ao se apoiar demais nos dramas pessoais e nos clichês sentimentais. Até o momento, os dilemas artísticos e comerciais de se montar uma produção na Broadway ainda não foram explorados, embora se façam presentes.
Smash não é a versão adulta de Glee, como se esperava que fosse quando foi anunciada. Ela tem potencial para tanto, mas precisaria de mais maturidade no desenvolvimento das situações e dos diálogos. Se levada a sério, os problemas aparecem. Por enquanto Smash é um melodrama novelesco indicado a pessoas que, interessadas no tema, buscam por um guilty pleasure (prazer com culpa).
A produção estreou em fevereiro conquistando a média de 11.44 milhões de telespectadores ao vivo, com 3.8/10 de rating/share entre o público alvo do anunciante (18-49 anos). Ao longo da exibição dos episódios seguintes, Smash perdeu parte de sua audiência. O sétimo episódio registrou sua segunda audiência mais baixa, com 6.56 milhões ao vivo. Até o momento, a série mantém cerca de 7.7 milhões ao vivo, com 2.6% entre o público alvo do anunciante (18-49 anos). A esse número não está somada a audiência que deixa gravando para assistir mais tarde.
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